quinta-feira, 25 de dezembro de 2008

ISTO TAMBÉM ERA HOLLYWOOD ("That's Entertainment, Part 2")


"Oito estréias e duas “reprises” na semana. Cinco das estréias são americanas: “Isto Também era Hollywood”, “Maratona da Morte”, “A Última Loucura de Mel Brooks”, “A Violentada”, “Pelos Meus Direitos”. E as demais são “Polícia Contra Bandoleiros” (japonesa), “Zé Sexy Louco, Muito Louco por Mulher” (nacional) e “A Mariposa da Noite” (argentina). As “reprises” são “Caçada Sádica” (dos EUA) e “O Gladiador Invencível” (italiana).

Há uma fita de John Schlesinger com Laurence Olivier, há a estréia de Margaux Hemingway, há a “última loucura” de Mel Brooks. Mas o mais importante, o mais fascinante é a segunda parte de “That’s Entertainment”. Que traz Judy Garland, ainda menina e logo insubstituível cantora, “show woman”, atriz romântica, satírica, dramática. Que traz Ethel Waters no negro musical “Uma Cabana no Céu”, se bem que não traga os geniais Rex Ingram e Duke Ellington. Que não traz Frances Langford cantando aquele sensacional “Broadway Rhythm” em “Melodia da Broadway de 1936”, mas traz o fundamental e (no Brasil) perseguido produtor Arthur Freed cantando algumas notas de sua composição “Wedding of the Painted Doll”. Que não traz a sensualidade e a força telúrica espanhola do bailado “Niña”, com Gene Kelly, nem as expressionísticas seqüências da hipnose e enforcamento em “O Pirata”, nem ainda a imaginária ópera “Czaritza”, com música de Tschaikowski para Jeannette MacDonald & Nelson Eddy em “Primavera”. Mas traz Greta Garbo, sem John Barrymore, querendo ficar só em “Grand Hotel” e querendo ficar a sós com Melvyn Douglas em “Ninotchka”. Que traz Astaire & Ginger Rogers dançando em “Ciúme, Sinal de Amor”, traz William Powell & Myrna Loy, a maravilhosa Katharine Hepburn de “The Philadelphia Story”, “bits” de Laurel & Hardy, dos Marx & Margaret Dumont, Margaret O’Brien, Kathryn Grayson. E Mickey Rooney, Chevalier, Ann Sothern, Vivien Leigh, Clark Gable, Constance Bennett e tanta gente, e tantos trechos de filmes mais.


ISTO TAMBÉM ERA HOLLYWOOD


Seqüência a “Era uma Vez em Hollywood”, a coletânea de êxito mundial sobre os melhores (no julgamento de seu realizador Jack Haley Jr.) momentos da longa série de musicais (cerca de 200) que os estúdios da Metro produziram entre 1929 e 1958. Mais uma oportunidade para que aqui a crítica repita o medievalismo cometido quando da explosão estilística e renovadora do gênero entre 1943 e 1948 (de “Uma Cabana no Céu” a “O Pirata”). E repita também a falta de malícia ao se deixar apanhar encarando (exatamente como os “big boss” do estúdio teriam achado “produtivo”) apenas como distração, e não como uma antologia, um ensaio onde a criação artística, a seriedade e a montagem cinemática deveriam ter parte preponderante, a película anterior, aparecida em 1973.

No caso atual não houve o agrado esperado. Da crítica estrangeira atenta, conhecedora e responsável, claro. Mas não, como supõe Richard Gertner no “Motion Picture Herald” de 19 de maio último, porque “That’s nº 1” já havia esgotado o estoque, o “creme de la creme” dos “metro-musicais” de todos esses 30 anos. Mas sim porque essa era uma tarefa para ser realizada em conjunto por diretores exponenciais do gênero como Mamoulian, Lubitsch, Minnelli, em cooperação com um cineasta social, sociológico e humano como King Vidor, com talvez o Louis Malle que fez da mítica de Brigitte Bardot um documentário dramático e estético como “Vie Privée”, em colaboração com o Resnais que avançou e recuou no Tempo, na Memória e nas emoções dramáticas, visuais, musicais e de movimento em “Hiroshima” e “Marienbad” e com a perspectiva, também, de um crítico capaz de fazer de suas críticas atos de criação, de admiração, de unção e de humanismo como o inglês Tom Milne ao se debruçar sobre um filme de 44 anos atrás como “O Último Vôo”, a primeira direção americana de William Dieterle.

As omissões, a frieza, a diretriz comercial aqui estão, com certeza. E estará ainda uma apreciação geral, mais dispersiva, frívola e superficial que a que “adorou” “Era uma Vez...” Mas não importa. Porque, muito mais do que a oportunidade que poderiam dar os esforços de uma centena de cine-clubes em 30 anos, haverá a possibilidade, em trechos ao acaso, ao sabor da bilheteria, ao azar da falta de uma verdadeira edição, de uma criteriosa seleção, de uma maravilhosa criação, de se ver ou entrever o que de outra forma seria impossível.

Desde raridades como Jean Harlow em “Mademoiselle Dinamite”, como Bing Crosby cantando “Temptation” para Fifi D’Orsay em “Delírio de Hollywood”, como Judy Garland e Gene Kelly dando uma demonstração única de “Commedia Dell Arte” com o “Be a Clown” de “The Pirate”, como Fred Astaire cantando e dançando o extraordinário “Steppin Out with My Baby” em “Desfile de Páscoa”, até Greta Garbo que, segundo testemunha nosso companheiro Carlos Motta, emudeceu a sessão inaugural do último festival de Cannes quando apareceu dançando “La Chica Chaca”, no seu, à época, tão injustiçado canto de cisne “Two Faced Woman”."


Publicado originalmente no "O Estado de S. Paulo" de 19/12/76.


terça-feira, 11 de novembro de 2008

AS GRÃNFINAS E O CAMELÔ

“Pseudopornô, comédia erótica (ou pornochanchada mesmo) produzida pela empresa do galã Carlo Mossy, não só para veículo estelar do próprio, mas para “faturar horrores”, que ele não oculta essa intenção. Na história três moças ricas e ociosas fazem uma aposta: quem transformaria um camelô num cavalheiro, no período de um mês? Mossy, o escolhido, é tratado a pão-de-ló mas tem inconvincentes escrúpulos românticos e moralistas. Por outra, a tarefa das meninas só seria necessária se os tempos não fossem esse que aí está. Mas como a fita parece ter sido baseada em “Irene, a Teimosa”, como o cartaz e as fotos coloridas estão surpreendentemente bem feitos e com certo gosto, como Mossy apesar da adesão ao mercantilismo do nosso cinema sempre é um tipo de alguma escola, e como desta vez o grupo de atrizes parece bonito e bem tratado, quem sabe algo menos degradante que o habitual poderá ter acontecido? Tomara, que já não é sem tempo.”


Publicado originalmente no "O Estado de S. Paulo" de 13/02/77.



O JOGO DA VIDA


“Quarto longa metragem de Maurice Capovilla. Os dois primeiros ele fez porque imaginou e quis: “Bebel, Garota Propaganda” e “O Profeta da Fome”. O terceiro reescreveu e dirigiu a nosso convite, baseado num “livro poético” escolhido pela atriz Amiria Veronese e projeto do qual Ozualdo Candeias havia desistido. Nova história e “script” porém eram seus, ele teve liberdade de fazer o que podia, dados urgência de tempo e algum compromisso com o “motivo” inicial. Mas certamente algo ligado ao cinema de Val Lewton ou ao “Belle de Jour” de Buñuel não se relacionava com a vivência ou a ambientação paulistana que muitos louvaram em “Bebel” e que parece ser o que mais o interessou no conto de João Antonio que agora levou à tela e do qual há referências ótimas e aguardamos o melhor resultado.”


Publicado originalmente no "O Estado de S. Paulo" de 27/11/77.


O CASO CLÁUDIA

“Desde sua pré-história com “O Crime de Cravinhos” ou as várias versões dos mais de um reais “Crimes da Mala” até “O Assalto ao Trem Pagador”, e de “O Assalto” até o “oportuno” e “utilíssimo” “Lúcio Flávio, o Passageiro da Agonia” que uma das “piéces de resistence” ou das “weakness” do cinema nacional vem sendo o aproveitamento de casos policiais ou crimes famosos. “O Caso Cláudia” não poderia escapar à regra, ainda que (como aliás no mundo todo, sobretudo no cinema norte-americano) para evitar aborrecimentos posteriores o mais prático seja sempre utilizar o chamariz da manchete e tratar o problema por analogias, tangentes e advertências. Aqui o caso é mais de Flávia (Kátia D’Angelo) que de Cláudia (a novata Lilian Stavik, em fugaz ponta). Evidentemente este não é o filme sobre o Piauí que o ferrenho mas reflexivo e aberto Miguel Borges (o mesmo do valiosamente visual “Pecado na Sacristia”) continua devendo ao cinema brasileiro, mas parece ser obra em que seu empenho de realizador sempre se faz sentir. Pelas fotos, há que salientar a propriedade da colocação do ator teatral Jonas Bloch no personagem decalcado em Michel Frank. E a seu propósito saem também crítica e reportagem nesta mesma edição de hoje.”


Publicado originalmente no "O Estado de S. Paulo" de 05/08/79.



PONTAL DA SOLIDÃO

“Um dos filmes mais esperados da moderna produção nacional. Estreando como diretor-autor, Alberto Ruschel situa-se num plano diverso de quase todos os seus colegas atores (Dionísio Azevedo, Jece Valadão, Aurélio Teixeira, Egidio Eccio, David Cardoso, John Herbert, Sergio Hingst) que também passaram à realização, obtendo uma obra certamente alheia a certos cânones, mas sem nunca desdenhar o insólito, o inédito, o poético, o estremamente pessoal, o absolutamente seu. A ação, praticamente um duo. Um velho marujo que vive num lugar isolado. A menina (Débora Duarte) que foge de uma provação pensando em suicídio e coloca-se sob sua proteção. E a volta dos criminosos, que ainda pensam em se vingar de sua vítima. Um filme estranho e bonito, “rodado” em maravilhosos locais do Rio Grande do Sul e que precisa ser devidamente apreciado.”


Publicado originalmente no "O Estado de S. Paulo" de 14/10/79.



ME DEIXA DE QUATRO

“Nova realização de Fauzi Mansur. Quanto ao ponto de partida, uma espécie de “Uma Virgem para o Príncipe”, mas a ambientação (e as imposições medievais) trocados dos feudos renascentistas para o bairro do Canindé e os costumes e códigos de honra dos descendentes de italianos, trazendo um polígamo e feliz borracheiro (o basco Serafim Gonzales), só que preocupado porque seu sensível filho (Arlindo Barreto) anda em companhias dúbias e ainda não provou seus pendores para o sexo oposto. Tudo faz para resolver o problema, até mesmo recorrer aos bons ofícios da submissa amante (Helena Ramos, mais aceitável porque, como em “Bacalhau”, devolvida ao seu natural que é o ambiente suburbano e sem sofisticação alguma). Mas como peixe n’água deverá estar Rossana Ghessa, que como legítima italiana fica ótima em papéis populares, à Monica Vitti ou Mariângela Melato, conforme já o provou em “Convite ao Prazer” e na “comédia à italiana” em episódios: “As Secretárias que Fazem de Tudo”.”


Publicado originalmente no "O Estado de S. Paulo" de 11/10/81.



COM MULHER...É BEM MELHOR

“O título vem naquela mesma “tradição” que desde a “chanchada” (não a atual “pornô” – referida) faz escola em nosso cinema, seja do Rio, paulista: “Esta é Fina”, “Pra Lá de Boa”, “Sai de Baixo”, “De Pernas pro Ar”, “É Com Este que Eu Vou”, “Não Adianta Chorar”, “A Vida é uma Gargalhada” e outros que tais, que obviamente nada tem a ver com a vida interior ou a transparência do espírito, personagens ou dramas de Virginia Woolf ou Katherine Mansfield. Do diretor Nascimento, em fins de 1976, aqui tivemos uma equivalência, com a produção de “Zé Sexy, Louco, Muito Louco por Mulher”. Se quisessem, ou soubessem, ou pensassem, com mais economia e até mais resultado, inclusive no plano internacional, poderiam ter mobilizado, do elenco, a beleza e juventude da balcânica Novany Novakovsky e, da cenografia, o apessoado de Waldir Siebert e plagiado ou repetido com algum realismo e alguma força de indagação a mais, aquele “Adão e Eva”, filme de só duas pessoas que os mexicanos há um quarto de século realizaram com os pruridos e a castidade da época, com uma ex-miss França, Christiane Martel, e um galã local, Carlos Baena, sem se atreverem a quase nada daquilo que hoje, principalmente aqui no Brasil, é fácil, fácil, à toa, à toa...”


Publicado originalmente no "O Estado de S. Paulo" de 14/02/82.



O HOMEM DO PAU BRASIL

“Em vista do que resultou de sua formação, de suas influências da mineirice, carioquice e até mesmo paulistanice, em vista do que ele pode e quer ser, gosta e seus acólitos gostam nele, em vista, também, de seu tipo de cultura e de empenho, em vista do incoercível binômio, que lhe deu origem – o “cinema-novismo” como manifestação de uma sempiterna, sempre igual e nunca renovada classe dominante – não há dúvida que Joaquim Pedro de Andrade é um dos diretores não por demais prolíficos, mas mais bem-sucedidos do cinema nacional. E aqui está seu sexto longa-metragem, uma versão da mítica “Oswald de Andrade”, provavelmente feita com uma inventiva – a “porque me ufano” – à brasileira. E no qual, como uma espécie de mito e da trajetória de Tarsila do Amaral, Dina Sfat deverá ter, em seguida a “Eros” e, juntamente com “Álbum de Família”, seu terceiro “grand portrait” consecutivo num cinema, como o nosso, que muito precisa deles.”


Publicado originalmente no "O Estado de S. Paulo" de 21/02/82.


MULHERES


"Imperial, utilizando assunto de Pasolini. No conto do diretor de “Il Decameron”, o Amor era também a Morte e consubstanciava-se num efebo de olhos azuis que destruía o protagonista. Aqui este é Imperial e a destruição vem na forma de uma dourada “ninfeta” de 15 anos e que é a principal de um “background” todo feminino, como na fita anterior do mesmo Imperial, intitulada “As Delícias do Sexo”. Não atinamos o que poderá ter resultado desta “transmutação” – só lembramos que em “Delícias”, o mais efetivo e engraçado era a tônica pantagruélica do próprio Imperial como ator."


Publicado originalmente no "O Estado de S. Paulo" de 02/05/82.


AMOR E TRAIÇÃO ("A Pele do Bicho")

"Um financiamento total da Embrafilme e, por incrível que pareça, justo e merecido. Mas, talvez por isso mesmo, a própria empresa e distribuidora estatal, com toda a sua máquina montada, não conseguiu lançá-lo comercialmente, durante cerca de um ano e só o fez quando mudou título primitivo (“A Pele do Bicho”) para o atual “Amor e Traição”. Baseada na peça “Chapéu de Sebo” do nordestino Francisco Pereira da Silva, a fita parece beneficiar-se do bom nível cinemático do diretor Pedro Camargo e de certa intocada pureza ambiental ainda remanescente em Pernambuco. Vaqueiro (Sílvio Correa Lima) casa com cabocla (Cláudia Ohana) mas a beleza desta desperta a cobiça, tanto do coronel local (Jofre Soares) como do filho deste (Paulo de Oliveira). O golpe é enviar o jovem marido para longas viagens. O flagrante e o crime de honra são inevitáveis e o rapaz é preso. Mas uma pintora carioca (a inefável e convencidíssima Ítala Nandi) descobre nele um “primitivismo sensual” e sua defesa torna-se ainda mais problemática, até o desenlace final. Cláudia, filha da falecida montadora nissei Nazareth Ohana, era a única figura não feia ou artificial de “O Menino do Rio” e poderá tornar-se espécie de Junko Fuji ou Nancy Kwan nacional. A fita foi apreciada por quantos já a viram."

Publicado originalmente no "O Estado de S. Paulo" de 09/05/82.



segunda-feira, 10 de novembro de 2008

AS SAFADAS


"Resultado de uma lei de obrigatoriedade mal formulada. Filme “rodado” simultaneamente em menos de uma semana, em três episódios e com três diretores (preferivelmente também autores fotógrafos, fazendo câmera ou cenografia e montagem), desimcumbindo-se fustigados da tarefa. As três histórias são obrigatoriamente eróticas, e o mais mencionável é a estréia na direção do montador Inácio Araujo. Na história de Carlão Reichenbach, Zilda Mayo é a “Vamp” dos fliperamas, explorada por um cafetão (Koppa, ótimo, e dando até sentido ao cartaz de publicidade). Na de Inácio, dois casais humildes em desencontro, apesar da ligação puramente física de um deles, acabam descobrindo a compreensão numa troca de parceiros. E na de Toninho Meliande, a amarfanhada Vanessa vai casar com moço quarentão, para poder comprar o enxoval, aconselhada por uma expert resolve ceder até certos limites a lubricidade de três ricos e maduros cavalheiros: Hingst, Dias e Pignatari."


Publicado originalmente no "O Estado de S. Paulo" de 09/05/82.


sexta-feira, 24 de outubro de 2008

CAMA EM SOCIEDADE (CATHERINE ET CIE.)


“Já está longe o tempo (como passa!) em que Michel Boisrond, na qualidade de quase discípulo de René Clair, era o feliz diretor de uma quase adolescente, ascendente e esplendorosa Brigitte Bardot em filmes como “Cette Sacrée Gamine”, “O Príncipe e a Parisiense”, “Voulez-Vous Danser Avec Moi?”, “Amours Célebres”. Aqui ele retorna tendo como trunfo Jane Birkin, que surge na pele de inglesinha (o que ela realmente é) que vai a Paris e lá, a fim de sobreviver, se transforma numa firma, cujo mais capital e triunfo são ela mesma. Não confundir porém com nossas pornochanchadas, nem mesmo com aquelas “pseudo-sociais”, que afinal acabam sendo as piores porque mais mascaradas e mais insidiosas e, sobretudo, com maior voracidade e mais esperteza para auferir a meta suprema – lucro, o vil metal, dinheiro, moeda somante.”


Publicado originalmente no "O Estado de S. Paulo" de 12/03/78.


DANIEL, O CAPANGA DE DEUS


“Por que se chama “Daniel, o Capanga de Deus” se é livro todo a base de imagens, personagens e episódios (intencionalmente) desconexos, como um Henry Miller diluído (ou “readers digestizado”?) de “Sexus”, “Nexus” ou “Plexus” e bastante “aprés” “la lettre”? E porque desmistificação do cangaço se as fotos expostas nos cinemas (aliás bonitas mas intelectualizadas demais para um filme que claramente avança pelo prestígio televisivo de Regina Duarte, e em dois papéis, o que deve ter sido bastante difícil para a mística caseira da eterna e campônia “jeune fille” utilizada em “Lance Maior” e “Chão Bruto”) sugerem obra muito para delírios de mitomanias eróticas de “ids” masculinos? Aliás, estas reincidências de especularem sobre os nus ou os não-nus de Regina Duarte é um “problema” que só concerne aos dilemas de “pruderie” das “menageres” que se escravizam à obrigação seriada e dulcurosa das telenovelas. Obrigação que de forma alguma pode condizer com a plasticidade tipo John Korty (o diretor húngaro do estranhíssimo “A Corrente da Vida”) que a citada coleção de fotos faz supor. Audácia criativa? Ou confusionismo intencionalmente nacional? De qualquer maneira, a estréia no longo-metragem de um (conhecido? Controvertido?) ex-realizador de curtas publicitários que poderá criar ou desejar polêmica.”


Publicado originalmente no "O Estado de S. Paulo" de 22.01.78.


MANICURES A DOMICILIO

“Comédia erótica e carioca típica de Carlo Mossy. E não podemos incriminar completamente o jovem ator-produtor por não se arriscar ou não empenhar mais, pois quando ele tenta caprichar um pouco (“As Granfinas e o Camelô”) ou mudar de linha (o “sério” e aqui ainda inédito “Ódio”) arca com resultados na bilheteria. Muita coisa está errada – e muito! – no cinema brasileiro e não cabe a ninguém, isoladamente, tentar salvar a pátria.”


Publicado originalmente no "O Estado de S. Paulo" de 12.02.78.



QUESTÃO DE TEMPO (A Matter of Time)

"A julgar pelo “trailler” um dos melhores filmes de recente Minnelli (fora, naturalmente, os da fase áurea de “Uma Cabana no Céu”, “Agora Seremos Felizes”, “O Ponteiro da Saudade”, dos trechos de “Ziegfeld Follies”, “O Pirata”) e lembrando muito, como atmosfera, plasticidade e intenções o controvertido (teria sido malogrado mais por causa de Barbra Streisand?) “Num Dia Claro de Verão”. Aqui um pouco da fábula da Gata Borralheira de encontro com uma personagem que tanto pode ser a Estela adulta de “Grandes Esperanças” de Dickens, como a heroína do faulknereano “Uma Rosa Para Emily”, como ainda a velha senhora da “Visita”, de Durrenmatt. A fita foi “rodada” na Europa, melhor falando na Itália, uma Itália imutável, ainda entre o sonho do “Ottocento” e os dias agitados da Via Veneto. Liza Minnelli é a pequena camareira que sonha com o êxito. Ingrid é a velha fada, a grande dama cujo passado é o de um “Kane” ou um “Monsieur Arkadin” de saias. Uma antiga e fabulosa condessa, mas felizmente, sempre Ingrid Bergman. E talvez ótimas oportunidades também para veteranos ou excelências como Charles Boyer, Ferzetti, Nazzari, Anna Proclemer. E, ainda, quem sabe para a linda filha de Ingrid, Isabella Rossellini. A ver, claro."


Publicado originalmente no "O Estado de S. Paulo" de 21/05/78.



O REI DA NOITE

“Homenagem nostálgica à velha São Paulo do tempo em que ainda havia garoa, ruas escuras, cabarés segundo o modelo francês e uma vida boêmica (não obstante a população ser oito, dez ou doze vezes menor) parecida às das capitais internacionais, como Paris, Budapest, Madrid, Buenos Aires. Ou quase um filme de caráter biográfico? Ou um “hommage” mais à velha e sempre recordada Buenos Aires dos estertores da milonga e da ascenção de Gardel? De qualquer maneira a história de um conquistador à “vieille maniere”, um tanto estranha, um tanto “traduzidamente” chamado Tertuliano Jatobá da Silva, mais nome de jagunço ou cangaceiro do que de contemporâneo de Valentino, Ricardo Cortez, Adolphe Menjou, Paraguassú, Batista Junior. Tertuliano, ou melhor Tézinho é Paulo José, o Rei da Noite, enquanto que Marília Pêra, muito misto de Barbara Streisand e de Dulcina de Morais, é Pupi, a sensação dos “auberges” de Cristal, dos “Moulin Rouge” das antigas ruas Aurora, Sete de Abril ou Amador Bueno. E a atriz de formação circense, Vic Militello, elogiadíssima pela equipe realizadora, faz a esposa predatória e infiel de Tézinho. Aqui o cenógrafo Laonte Klawa poderá ter encontrado ótima oportunidade. A fita lança um novo diretor paulista, na pessoa do rumeno-argentino Hector Babenco, o mesmo que participou de “O Fabuloso Fitipaldi” e que já trabalhou na Sincro Filmes e, ao que parece, também no cinema publicitário. E no elenco suplementar, duas figuras efetivas do cinema de São Paulo: Francisco Curcio e Carlos Bucka, além da beleza loura de Dorothée Marie Bouvier.”


Publicado originalmente no "O Estado de S. Paulo" de 09/05/76.



YOJIMBO, O GUARDA-COSTAS (Yojimbo)

"Um Kurosawa da fase do sarcasmo (“Sanjuro”, “A Fortaleza Escondida”, “Os Homens que Pisaram na Cauda do Tigre”). Interessante, portanto, agora uma revisão e um confronto com o Kurosawa da fase (ou dos filmes, já que tendências e resultados se alternam e até se antagonizam) mais humanista geralmente influenciada pela grande literatura russa de Tolstoi, Dostowievski: “Ralé”, “Hakuchi, o Idiota”, de certo modo sendo licito aqui também incluir “Viver”, “Akahige, o Barba-Ruiva” e o redentor “Dodeskaden, o Caminho da Vida”, obras baseadas em originais ou de outras fontes. Aqui temos a trajetória irônica de um “samurai” de aluguel, espécie de um “wandering hero” ou um “Shane” do oeste americano às avessas. O ator predileto do cineasta, Toshiro Mifune, naturalmente tem o papel titular, o papel principal. Mas os “essenciais” do elenco são outros: Susumu Fujita, Akira Nishimura, Seisaburo Kawazu, os falecidos Eijro Tono, Daisuke Kato, Kyo Sazauka, mais Takashi Shimura, a kabukeana Isuzu Yamada, a lindíssima Yoko Tsukasa. A fita aqui foi originalmente lançada a 10 de novembro de 1962, na sempre lembrada fase japonesa do Cine Scala, hoje, Belas Artes – Centro."


Publicado originalmente no "O Estado de S. Paulo" de 13/06/76.





domingo, 10 de agosto de 2008

HOMENAGEM AO CENTENÁRIO DA IMIGRAÇÃO JAPONESA NO BRASIL


A TEIA DOS CORRUPTOS (“Kokuso sezu”)

“Combinação de mistério e intriga com corrupção política, ambição, chantagem e outros ingredientes propícios para que o “engagé” Hiromichi Horikawa, antigo discípulo de Kurosawa, dê vazão às suas ferrenhas convicções sobre o que seja proselitismo, crítica social. O mal não é propriamente o engajamento, mas sobretudo a tendência ao “virtuosismo”, aos formalismos e ao exagero, bem como a falta de vibração cinemática do diretor. Na história, político inescrupuloso às vésperas da eleição recorre a ministro do partido contrário, prometendo-lhe virar bandeira em troca de apoio econômico. O ministro entrega vultosa quantia, mas o emissário do político, sabendo que não pode ser processado por roubo, uma vez que o dinheiro está ligado à corrupção e a manobras ilegais, desaparece disposto a realizar seus sonhos e ambições pessoais. Como se depreende, apesar de Horikawa, a impressão é de que a história é muito nossa conhecida. E não só no ambiente da política...No elenco, o grande veterano Fumio Watanabe e, como o enganado ministro, Eitaro Ozawa.”

Publicado originalmente no "O Estado de S. Paulo" de 04/04/76.

ANATOMIA DO MEDO (“Ikimono no Kiroku”)

“Importante realização japonesa de 1955, posterior a “Hakuchi, o Idiota” (que o “Cinema Um” do Rio já trouxe e exibiu mas parece não estar querendo lançar em São Paulo) mas posterior a “Os Homens que Pisaram na Cauda do Tigre” (que particularmente importamos e entregamos à Toho mas que agora é o “Cinema Um” do Rio parece não estar interessado) e anterior à “Ralé”, o outro clássico inédito de Kurosawa que juntamente com este solicitamos à Toho que trouxesse para o nosso público. De qualquer maneira um dos filmes mais controvertidos e famosos da fase mais prestigiada de Akira Kurosawa. Na história, um idoso industrial japonês, apavorado ante nova catástrofe atômica resolve (a conselho de um fazendeiro patrício que vive aqui em São Paulo), vender todos os seus bens e se refugiar no Brasil. A ganância de sua família porém, insurge-se contra ele e toma medidas drásticas para o que considera sua loucura. Toshiro Mifune, claro, interpreta o protagonista, secundado por ótimos interpretes do cinema japonês de então: Takashi Shimura, Minoru Chiaki, Eijiro Tono, bem como a característica Eiko Miyoshi, Noriko Sengoku, Kyoko Kagawa e Akemi Negishi, esta a “mulher fatal” de “A Saga de Anahatan”, o derradeiro (e aqui ainda inédito) filme de Josef Von Sternberg. Sem dúvida, um dos grandes lançamentos deste ano e, no entanto, obra que nenhum outro “cinema de arte” daqui de São Paulo estava interessado em exibir.”
Publicado originalmente no "O Estado de S. Paulo" de 28/02/77 .

DERSU UZALA

“Justamente quando deixou de fazer apelações a um sarcasmo e a “utilidades” convenientes à “festiva” (não bem o que anda confessando Yves Montand), pendendo, como era natural e inevitável, para um humanismo bem à Gorki, à peculiaridades legítimas e anímicas de uma silenciosa vivência oriental, Kurosawa caiu em desgraça e isso não deve ter sido só conseqüência do menor êxito comercial do inesperado “Dodes’kaden”. Como soe ocorrer, o isolamento foi tão cruel, a decepção e o estupor foram tão fortes que o cineasta até chegou à tentativa de suicídio. A possibilidade de recuperação veio com esta fita, que os estúdios soviéticos aceitaram co-produzir e que, no dizer da maioria, surge envolta em uma profunda beleza graças ao retrato que faz de um homem solitário e solidário a solidão que ele pressente no mundo. De certo modo, o drama real da existência do guia asiático “Dersu Uzala” tem muitos pontos de contactos com o de outra personagem antológica do cinema japonês, o pescador e vigia de Hokkaido que passou toda sua vida num farol do norte gelado de seu país – papel do grande Hisaya Morishige em “O Homem do Horizonte” o filme também clássico de Seiji Hisamatsu. “Dersu Uzala”, personagem russo que realmente existiu, levado à tela ganhou o “Oscar” de melhor filme de 1976 e agora dará, talvez, novo alento à carreira do cineasta de “Ralé”, “Viver”, “Rashomon” e tantas obras elogiadas e premiadas internacionalmente. A ver, sem dúvida alguma.”

Publicado originalmente no "O Estado de S. Paulo" de 02/10/77.


DELÍRIO NOTURNO – POSSUÍDA PELO DEMÔNIO (“Keokeimu – Yoba”)

“Masaichi Nagata, era diretor-geral da Daiei, foi o produtor pessoal de “RashoMon” e o artífice maior dos êxitos que aquele estúdio habitualmente obtinha em Cannes, Veneza e Berlim na época que o filme de Kurosawa chamou a atenção do mundo para o cinema que se fazia no Japão. Ironicamente, a Daiei, que era a Metro de lá, além de nunca ter conseguido sala própria nem distribuição corrente, nem mesmo aqui em São Paulo, fechou as suas portas. E esta fita, produzida principalmente por Nagata, é um esforço dele no sentido de tentar reviver os dias de prestigio de seu estúdio. Como filme pode ter sido motivado pelo êxito comercial de “O Exorcista”, mas a história pertence ao mesmo autor do conto original de “Rasho Mon” Ryunosuke Akutagawa, que se suicidou lá pelos anos 30. A protagonista feminina é a mesma, Machiko Kyo, bem como o iluminador Kazuo Miyagawa. A história gira em torno de uma mulher (Machiko) que começa a se deixar envolver pela mania de demônios e bruxedos. O diretor é o engajadíssimo Tadashi Imai de “Até que o Destino nos Uma”, “Torre de Liz”, “Arroz”, “A Trágica Lee Line”, “Juramento de Obediência”, este, aliás, o único dos seus filmes mais elogiados que não contou, no roteiro, com a colaboração da escritora Yoko Mizuki. Ainda no elenco outros atores do último áureo período do cinema nipônico: Kiyshi Kodama, Shinjiro Ebara, Taketoshi Naito, a característica Tanie Kitabayashi, e sobretudo o antológico Rentaro Mikuni. Provavelmente o lançamento mais caracterizado da semana.”

Publicado originalmente no "O Estado de S. Paulo" de 11/03/79.

O IMPÉRIO DA PAIXÃO (“Ai no Borei”)

“O igualmente hiper-elogiado e famosíssimo filme japonês (também maiormente financiado por franceses) com o qual o diretor Nagisa Oshima prossegue na linha exacerbada e audaciosamente erótica e passional de “O Império dos Sentidos”, obra de impacto mundial surgido em 1976 e que naturalmente não chegou a este tíbio e mesquinho mercado cinematográfico. Dois amantes, ele jovem, ela madura, matam o marido importuno afim de mais alucinadamente fruírem seu amor ilícito. Uma história de paixão, sexo, crime e expiação que lembra “Os Contos da Lua Vaga”, de Mizoguchi, “Kwaidan”, de Kobayashi e outras obras-primas do cinema e da literatura nipônica. Audaz, maldito, absolutamente a ver.”

Publicado originalmente no "O Estado de S. Paulo" de 26/08/79.

O SEGREDO DO CASTELO DE EDO (“Ooku Marohu Monogatari”)

“Já que não podemos rever o clássico “As Cinco Mágicas” (a cópia deve ter deteriorado), nada mais oportuno do que a reapreciação deste também bonito e expressivo filme de Sadao Nakajima, o diretor japonês que se antecipou à moderna voga erótica, mestre inconteste do gênero e, incrivelmente, sem oportunidade de cultuá-lo no atual cinema de seu país. No castelo de Edo, em princípios de 1700, reinado de Ienori Tokugawa, o dramático relato do recrutamento das filhas de samurais e comerciantes para o harém do shogun. Espesinhamento moral e sentimental, medo, rivalidades, cobiça, inveja, luxúria, intrigas, crime. E, entre o intenso e requintado tratamento de direção, encenação, etc., estrelas lindas, de lábios de cereja e pele de pétalas de rosa, como Yoshimo Sakuma, Junko Fuji e atrizes do “kabuki” como Isuzu Yamada e do melhor teatro japonês moderno, como Kyoko Kishida. A fita aqui foi originalmente lançada a 7 de abril de 1968, no mesmo Cine Niterói que a fez recensurar e, previamente, a “reprisou” pouco tempo atrás, para o público da colônia.”

Publicado originalmente no "O Estado de S. Paulo" de 28/09/80.


O RETRATO DE CHIEKO (“Chieko Sho”)

“A cópia provavelmente já esteja avermelhada, insatisfatória (é ainda daquelas, originais, que chegavam do Japão especialmente para o público da colônia). Mas quantas assim – “Zabriskie Point”, “Morangos e Sangue”, “Procura-se um Super Macho” – tivemos e estamos tendo em nosso inefável ambiente pós-ditadura do cinema-novismo, Embra-concine, e caterva? E como se trata de uma raridade (um filme japonês aqui lançado pelo mesmo cinema a 25 de janeiro de 1969, depois de concorrer em Berlim-67 e no mesmo ano ter sido um dos cinco finalistas na disputa ao “Oscar” de melhor película estrangeira) vamos dar-lhe maior atenção que a outros da mesma procedência e que, sem iguais antecedentes, vêm sendo recensurados e reapresentados nos remanescentes cinemas do bairro da Liberdade. O diretor Noboru Nakamura era um dos mais cativantes intimistas do cinema nipônico, era o sucessor de Ozu e Ohba na Shochiku. E entre seus intérpretes centrais, a sensitiva beleza de Shima Iwashita e a força de presença de Tetsuro Tamba, Eiji Okada, Takamaru Sasaki, Tadashi Kato, mais a música do grande Masaru Sato e o incrível apoio ‘técnico-artístico” do estúdio a época.”

Publicado originalmente no "O Estado de S. Paulo" de 09/11/80.

MIYAMOTO MUSASHI, DUELO NA ILHA DE GANRYU (“Miyamoto Musashi – Ganryujima no Ketto”)

"A quinta e última do cíclico que Tomu Uchida realizou para os estúdios Toei de 1961 e que já possibilitou obras do impacto e da expressão artística de “Miyamoto Musashi”, “Duelo de Hannyzaka” e “Duelo de Ichichoji”. Todas, aliás, evoluindo no singular clima de demonismo que é a grande constante, e característica fundamental do estilo do cineasta, um dos maiores que o cinema japonês e o internacional já revelaram em qualquer tempo. A narrativa desta vez prende-se à rivalidade e à obsessão de sangue e de vitória final que domina Musashi (Kinnosuke Nakamura) e o também legendário Kojiro Sasaki (Ken Takakura), espadachim que era considerado o maior da época de ambos. O filme, aqui originalmente lançado no antigo Cine Niterói em 1º de janeiro de 1966, claro, não pode sofrer comparação com nenhuma das rotineiras estréias que estamos tendo. Mas a cópia colorida e há 15 anos guardada é um problema que, se a técnica, a ganância ou a irresponsabilidade atuais não resolverem, toda a produção colorida do cinema irá perder-se irremediavelmente."

Publicado originalmente no "O Estado de S. Paulo" de 05/07/81.

É TRISTE SER HOMEM, 23ª. ÉPOCA (“Otoko Wa Tsurayo – Tonderu Torajiro”)

"Pobre Yoji Yamada. Tem qualidades de diretor-autor, capacidade de observação humana, de criação de clima, conforme já demonstrou, por exemplo, em “Quando a Primavera Chega Tarde” (“Kazoku”). É o diretor mais bem sucedido comercialmente do atual cinema japonês. E nesse mesmo cinema, antes de produção farta, agora parcimoniosa, é talvez o cineasta que mais trabalha. Tem, porém, de pagar um preço: ater-se quase que exclusivamente aos filmes desta série “Tora San”, o eternamente simplório e casadouro caixeiro-viajante interpretado por Kiyoshi Atsumi. Aqui, o personagem enfrenta o mais inusitado de seus habituais desenganos amorosos, pois começando a se interessar por uma mocinha (Kaori Momoi) acaba na verdade enamorado da mãe da mesma. E esta outra não é senão a veterana Michiyo Kogure, que anda aparecendo maltratada ultimamente, mas tempo já houve que era a mais sedutora mulher de um cinema como o japonês da fase áurea, ao qual, o menos que faltava eram atrizes e figuras femininas das mais belas e envolventes."

Publicado originalmente no "O Estado de S. Paulo" de 01/11/81.

ACONTECEU NO FIM DE TOKUGAWA (“Eejanaika”)

"Na última fase áurea do cinema japonês, o “engagé” e então jovem Shohei Imamura era o rei dos estúdios Nikkatsu, autor, entre outras, de obras de antologia como “Meu Irmão Nianchan”, “Todos Porcos”, “A Mulher Inseto”, “O Segredo de uma Esposa”. Agressivo, cru, desmistificador e contundente, Imamura fazia jus ao prestígio. Este é o filme que dele nos aparece após a falência de seu estúdio (hoje reativado para a produção “pornô”). Gira em torno de um lavrador que durante um passeio de barco naufraga e, recolhido por um navio americano, acaba ficando seis anos nos EUA. Ao voltar, não encontra a esposa, que durante a época de crise fora vendida pela família (dela) a uma companhia de artistas ambulantes. Acha-a e quer voltar com ela à America, mas a mulher tem medo e se recusa. Ele, então, torna-se um venal, trabalhando para o clã reinante dos Tokugawa (a época é 1866) e, ao mesmo tempo, para os inimigos do regime, o que o levará à tragédia final. Terá Imamura voltado aos seus melhores dias? A verificar."

Publicado originalmente no "O Estado de S. Paulo" de 26/12/82.