
domingo, 24 de julho de 2011
AS FUGITIVAS INSACIÁVEIS

terça-feira, 19 de julho de 2011
EXCITAÇÃO

"Longe da bitola do estrelismo narcísico-comercial de David Cardoso (“A Ilha do Desejo”, “Amadas e Violentadas”, “Possuídas Pelo Pecado”, obras que no entanto facultaram sua revelação e os indícios de uma tendência plástico-formal para situações efeitos sado-eróticos-masoquistas), com “Excitação” o jovem diretor Jean Garrett surpreende até mesmo àqueles destituídos de preconceitos “culturais” que conseguiram aquilatar de suas potencialidades em melhores circunstâncias. Pois elas se impõem neste novo filme, o mais profícuo e caprichado que M. Augusto Cervantes produziu até hoje. Não que inexistam assimetrias, contradições e fortes lapsos de entrecho, com situações e personagens desnecessariamente tomados de empréstimo a muitas obras anteriores (“Suspeita”, “À Meia luz”, “A Teia de Renda Negra”, e até “A Sétima Vitima”, de Val Lewton). Mas é quase a primeira vez que algo saído da Rua do Triunfo revela um gosto e uma capacidade de manipulação, um germe de linguagem para realizações de diverso teor: unidade, plasticidade, imaginação cinemática. Outro tento é a belíssima fotografia colorida de Carlos Reichenbach, toda em tons neutros e esmaecidos (como se fosse concebida para a Kim Novak de “Uma Vez por Semana” ou a Dominique Sanda de “Une Femme Douce”), bem dosada, atmosférica – uma das melhores que nosso cinema apresentou em muito tempo. Sugestiva também a escolha de locais “marinhos” e o emprego das roupas (ponto sempre ridículo nas fitas nacionais do atual e falso “boom” comercial). Inesperadamente efetivo o “modernoso” comentário musical de Beto Strada. E só dignas de elogios as atuações de Kate Hansen com sua entrega e Betty Saddy com seu “charme” carioca, ainda que seja de lamentar as poucas oportunidades a Liana Duval e Abrahão Farc. Não há “engagement”, falta certamente o grande entrecho, mas é flagrante uma capacidade de vir à tona para as exigências visuais expressivas e atmosféricas do cinema. E isso é muito."
Publicado originalmente no "O Estado de S. Paulo" de 29/05/77.
domingo, 10 de julho de 2011
O ESPÍRITO DA COLMÉIA ("El Espiritu de la Colmena")

"Segundo Saura o filme que o levou a utilizar a menina Ana Torrent em “Cria Cuervos”, senão mesmo que até o levou a imaginar e realizar essa sua magistral obra que amanhã, além do Olido e Bristol, passará também para a tela do Del Rey, tal o êxito (inesperado para os exibidores) felizmente alcançado nesta nossa nem sempre errada cidade. Como Saura depois em “Cria...”, também “El Espiritu de la Colmena” teve problemas e foi embargado algum tempo pela censura franquista. Mas o importantíssimo é que – sem cinismos e desaforos e sem se aproveitar do próprio poder oficial para fazer “festividade” – ambas as películas foram realizadas em pleno regime de Franco. E, ainda que através da alegoria, do fantástico realismo passível no cotidiano e no trivial, dão-nos um excepcional retrato da verdade e do sofrimento, da alma e dos anseios espanhóis de todo esse longo período de 40 anos de ditadura sofrida por seu povo. E ainda por cima, segundo o atestariam, senão os prêmios obtidos nos festivais de San Sebastian, Chicago, Londres e Nova York e os elogios de toda a imprensa do mundo civilizado, com certeza os testemunhos pessoais de nossos colegas Carlos Motta e Ewald Filho que os viram há três e dois anos em Cannes e Buenos Aires. A ação começa numa tarde de domingo, no ano de 1940 (época em que o impacto e as feridas da Guerra Civil ainda se faziam sentir) quando a uma pequena aldeia chega um velho caminhão com dois projetores na sua ronda mensal de cinema ambulante pelo interior do país. E para uma audiência principalmente de crianças exibem “Frankenstein”, o clássico de terror feito por James Whale em 1931. Duas meninas assistem à sessão e se vêm possuídas de fascinação pela película, mas ambas de maneira diferente. Isabel faz de tudo um jogo de imaginação. Ana, porém, cujo pai cria abelhas e cuja mãe tenta reviver o passado escrevendo cartas sem destino a um amor perdido, Ana, dizíamos, num processo de descoberta básica toma a projeção como uma realidade essencial. E quando, identificando-se com o monstro, imortalizado por Boris Karloff, e divagando pelos campos, encontra um homem misterioso, um fugitivo político, todo um processo de confronto entre bem e mal, uma consciência de vida e morte vêm a tona e uma estrutura original de cine-dramaturgia de realismo mágico e expressão poética configuram um filme cuja apreciação e entendimento se tornam capitais. Obrigatório."